02/04/2024 às 16h47min - Atualizada em 02/04/2024 às 16h47min

Nem pública, nem permissionada: A teoria dos jogos aplicada à escolha da rede ideal e o equilíbrio de Nash na busca por uma 3ª via

Ao analisar a adoção da tecnologia blockchain pelas instituições financeiras, percebe-se uma falta de padrão claro que direcione a escolha de uma rede ou tecnologia específica no contexto web3. Tanto instituições quanto reguladores ainda parecem estar em busca da solução ideal, tateando estratégias em meio a incertezas regulatórias e desenvolvimentos sigilosos, o que gera um ambiente de dúvidas generalizadas.
 
Minha Jornada até a Teoria dos Jogos
 
Antes de mergulhar no tema, é importante mencionar que minha experiência com a teoria dos jogos é básica. Embora um grande amigo e mentor tenha sugerido que eu publicasse um artigo revisado por pares, escolhi abordar o assunto de forma mais informal e acessível, visando ampliar meu entendimento e absorver diferentes perspectivas.
 
A inspiração para explorar esse campo surgiu após assistir ao filme "Uma Mente Brilhante", que narra a trajetória de John Nash, conhecido por seus trabalhos com a Teoria dos Jogos. Apesar de já ter algum conhecimento prévio, o filme aguçou minha curiosidade, levando-me a questionar como essa teoria poderia ser aplicada aos desafios atuais do setor blockchain, especialmente na escolha da rede mais adequada para instituições financeiras.
 
Nota pessoal: Atuo como CPO na Infratoken, onde oferecemos soluções web3 low-code para o setor financeiro, possibilitando a escolha entre redes públicas e permissionadas com estrutura híbrida. Também sou a diretora operacional da ABToken. Sendo assim, embora tente manter uma perspectiva neutra, algumas das minhas opiniões influenciaram as análises apresentadas neste artigo. Assim, encare este texto como um ponto de partida para a sua própria avaliação e tomada de decisão, em vez de uma verdade absoluta.
 





Se você chegou até aqui, provavelmente está inclinado a concluir a leitura, o que me deixa muito feliz. Agora, que os jogos comecem!
 
Introdução sobre a teoria dos jogos
 
Imagine uma luta de jiu-jitsu, uma partida de xadrez ou uma negociação comercial. Em todas essas situações, você e seus oponentes estão envolvidos em um jogo, onde cada jogador escolhe diferentes ações para melhorar suas recompensas. A Teoria dos Jogos é a ciência que estuda essas situações, fornecendo insights sobre como as decisões são tomadas e como elas influenciam o resultado das interações complexas.
 
Para entender melhor a Teoria dos Jogos, sugiro assistir a este vídeo explicativo: Teoria dos Jogos.
 
A Teoria dos Jogos introduz alguns conceitos fundamentais. Iremos usar esses conceitos a partir de agora, então tome nota:
 
Jogadores: São os indivíduos ou entidades que tomam decisões dentro do jogo.
 
Estratégias: Consistem nas opções de ações disponíveis para os jogadores.
 
Resultados (payoffs): São os resultados obtidos pelos jogadores, baseados nas estratégias escolhidas por todos.
 
Equilíbrio: Uma situação onde nenhum jogador se beneficia ao mudar sua estratégia unilateralmente, conhecido como Equilíbrio de Nash.
 
Quando estudamos a Teoria dos Jogos, estamos interessados em entender como as ações de um participante afetam as estratégias dos outros e vice-versa. Em outras palavras, busca-se compreender como cada jogador procura maximizar sua recompensa ou minimizar sua punição, considerando que todos os participantes são racionais.
 
O Equilíbrio de Nash
 
Um dos conceitos fundamentais da Teoria dos Jogos é o Equilíbrio de Nash, proposto pelo matemático John Nash. Nesse equilíbrio, nenhum jogador tem incentivo para mudar sua estratégia individualmente, pois isso não resultaria em melhorias de recompensa para ele. É como se todos estivessem "travados" em suas decisões, considerando que a estratégia atual é a melhor resposta às ações dos outros jogadores.
 
Em outras palavras, é um ponto de estabilidade em que cada jogador escolhe a melhor estratégia considerando as estratégias dos outros jogadores.
 
A importância do equilíbrio de Nash está relacionada à previsibilidade e análise das interações entre os jogadores em situações de competição ou cooperação. Ao identificar um equilíbrio de Nash em um jogo ou situação, é possível compreender melhor as decisões tomadas pelos jogadores e projetar as consequências dessas decisões.
 
Vamos a um exemplo prático pra ficar mais claro. Digamos que você e um amigo estão em uma competição para vender brigadeiro. Vocês podem escolher duas estratégias: vender os brigadeiros por um preço mais alto ou vender por um preço mais baixo. Agora, se você escolher vender por um preço mais alto, enquanto seu amigo escolher vender por um preço mais baixo, é provável que você acabe vendendo menos brigadeiros, porque as pessoas preferem o preço mais baixo.
 
Por outro lado, se ambos escolherem vender por um preço mais baixo, é mais provável que ambos tenham mais clientes e mais vendas.
 
Nesse exemplo simples, o Equilíbrio de Nash seria alcançado quando você e seu amigo escolhessem a estratégia de vender por um preço mais baixo, já que ninguém tem interesse em mudar para o preço mais alto individualmente. Isso ocorre porque cada um de vocês percebe que, se mudar de estratégia sozinho, não obterá uma vantagem real.
No contexto das instituições financeiras escolhendo uma blockchain para adotar, a teoria dos jogos e o equilíbrio de Nash podem ajudar a avaliar as opções estratégicas que podem ser adotadas, e como essas escolhas influenciam na recompensa (payoff) dos outros jogadores.
 
A matriz do jogo
 
A matriz do jogo é uma ferramenta visual que nos ajuda a representar as possíveis escolhas e resultados em um jogo ou situação de tomada de decisões. Ela é composta por linhas e colunas, onde cada jogador tem suas opções de estratégia representadas na matriz.
 
Vamos imaginar que dois jogadores, Alice e Bob, estão jogando um jogo. Na matriz do jogo, as linhas representam as estratégias possíveis de Alice, enquanto as colunas representam as estratégias de Bob. Os resultados possíveis do jogo são mostrados como números ou recompensas dentro da matriz.
 
Agora, para visualizar melhor isso, vamos pensar em um exemplo prático. Digamos que Alice e Bob estão decidindo se devem investir em um projeto de blockchain.
 
Alice tem duas opções:
 
investir todos os seus recursos no projeto (estratégia A)
não investir (estratégia B).
 
Bob também tem duas opções:
 
investir (estratégia X)
não investir (estratégia Y).
Dessa forma, teríamos uma matriz do jogo com duas linhas (A e B) e duas colunas (X e Y), cada uma mostrando os resultados possíveis para Alice e Bob. Para melhorar a eficiência, vamos unir as duas matrizes em uma. O primeiro valor será sempre a representação da linha (Alice), e o segundo será sempre a representação da coluna (Bob):

Agora, vamos atribuir recompensas (payoffs) para cada combinação:
 
  • Alice e Bob decidem investir: recompensa de 5 para Alice e 5 para Bob;
  • Alice e Bob decidem não investir: recompensa de 7 para Alice e 7 para Bob;
  • Alice decide não investir e Bob decide investir: recompensa de -2 para Alice e 10 para Bob;
  • Alice decide investir e Bob decide não investir: recompensa de 10 para Alice e -2 para Bob
 
Representando na matriz, ficaria assim:
A ideia é que os jogadores analisem a matriz do jogo e levem em consideração os resultados possíveis para cada combinação de estratégias. Eles buscam encontrar o equilíbrio de Nash (que, no caso, é quando A e B decidem investir), onde nenhum jogador tem incentivo para mudar sua estratégia individual, considerando as estratégias do outro jogador.
 
Aplicando a teoria dos jogos no mercado de blockchain
 
Com tanta competição e a falta de regulamentações claras, a teoria dos jogos possibilita uma análise detalhada das interações entre as diversas entidades envolvidas. Isso nos ajuda a prever as consequências das diferentes estratégias e identificar aquelas que podem levar a um equilíbrio estável, mesmo em um ambiente regulatório incerto.
 
No jogo, as instituições precisam encontrar um ponto de equilíbrio que maximize o benefício coletivo sem prejudicar os interesses individuais (payoffs). Esse equilíbrio pode resultar na escolha de uma nova forma de rede ou tecnologia que ofereça vantagens de configurações tanto públicas como permissionadas, sem se restringir a apenas uma delas (estratégias).
 
Premissas do Jogo
 
Para simular alguns cenários, vamos utilizar as seguintes premissas:

 
Obs: Sinta-se livre para criar seu próprio cenário, com suas próprias premissas! A simples alteração de premissas pode levar a um resultado completamente diferente, e é essa a mágica da teoria do jogo.
 
Conceitos:
 
Blockchain Pública (BP): Uma blockchain pública é uma rede descentralizada que é aberta à participação de qualquer pessoa. Essas redes geralmente são de código aberto, transparentes e não exigem permissões para ingressar ou participar. Exemplos bem conhecidos de blockchains públicas incluem Bitcoin e Ethereum.
 
Blockchain Permissionada (PP): é um tipo de sistema de registro distribuído que controla o acesso e as permissões dos usuários dentro da rede. Ao contrário das blockchains públicas, as blockchains permissionadas requerem que os usuários sejam autorizados para realizar certas ações dentro da rede, baseando-se geralmente em um sistema de governança estabelecido por um único entidade ou um consórcio de membros controladores. Exemplos de blockchains permissionadas incluem Hyperledger Besu, R3 Corda e Hyperledger Fabric.
 
Abordagem híbrida (HB): é um sistema que combina características de blockchains públicas e permissionadas, aproveitando os pontos fortes de cada uma e minimizando suas fraquezas. Este modelo proporciona maior flexibilidade, permitindo transações e acessos controlados dentro de uma rede mais ampla e aberta. Esse modelo, apesar de apresentar vantagens, exige uma maturidade tecnológica alta, que permita a criação de um sistema flexível o bastante para acompanhar as mudanças regulatórias e tecnológicas do setor financeiro.
 
Pontuações:
 
Transparência: Grau em que as atividades na blockchain são abertas aos usuários.
 
Custo: Despesas associadas à implementação e operação da blockchain.
 
Previsibilidade de Custos: Estabilidade e previsibilidade dos custos ao longo do tempo.
 
Privacidade: Proteção das informações e transações contra acesso não autorizado.
 
Controle: Nível de governança e autoridade sobre a rede.
 
Interoperabilidade: Facilidade com que a blockchain pode interagir e integrar-se com outras redes e sistemas.
 
Centralização: Grau em que o controle e a tomada de decisão estão concentrados.
 
Riscos: Potenciais ameaças e vulnerabilidades da rede.
 
Segurança: Medidas e protocolos para proteger a rede contra ataques e falhas.
 
Escalabilidade: Capacidade da blockchain de lidar com o crescimento e expansão.
 
Acesso ao mercado: Facilidade de entrar e competir no mercado relevante.
 
Adaptabilidade: Habilidade de ajustar-se a mudanças regulatórias e de mercado.
 
 
Considerando essas premissas como verdadeiras, podemos então avançar para as regras do nosso jogo.
 
Ficou curioso para começar a jogar? Então prepare-se, porque na próxima semana vou trazer a Parte 2. Aqui um pequeno aperitivo do que está por vir:
 
Próxima Semana: Parte 2 - O Curso do Jogo
 
Regras do Jogo: Você vai conhecer os jogadores e as estratégias que podem ser adotadas.
 
Simulação do Cenário: Como se comportarão nossas estratégias em ação? Vamos testar e observar as possíveis consequências e retornos (payoffs).
 
Soluções: Estratégias só são boas se nos levarem a algum lugar. Após testarmos todas as estratégias possíveis para a nossa simulação, chegaremos então ao tão aguardado Equilíbrio de Nash.
 
Espero que tenham gostado, e até semana que vem!
 
Agradecimentos especiais
 
Agradeço imensamente o apoio que recebi, não apenas para a elaboração deste artigo, mas ao longo de toda a minha trajetória empreendedora, em especial a:
 
Leandro Pereira (Sciammarella) 
Maurício Magaldi 
Regina Pedroso 
Conrado Pontes 
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